Renato Trincão (1920-1996)

Renato de Azevedo Correia Trincão nasceu em Vila da Feira, distrito de Aveiro, a 17 de Dezembro de 1920. Viveu em Coimbra desde os quatro anos de idade, passando quase toda a sua vida em casa do tio, o Professor Doutor Mário Trincão, a quem deve toda a sua formação como pessoa e a herança de um trabalho intelectual contínuo exemplar. Entre 1928 e 1931 teve instrução primária domiciliária, matriculando-se em 1932 no Liceu Central de José Falcão até ao 5º ano. Fez o 3º ciclo no Liceu Normal de D. João III para onde transitou por ter substituído o velho Liceu pelas novas instalações. Concluiu o liceu em 1939 tendo feito as cadeiras de letras e ciências e o respectivo exame de admissão. 

Entre 1940-1946 frequentou a Faculdade de Medicina onde obteve uma média de 19 valores recebendo várias honras académicas com Prémios a variadas cadeiras. Assim que terminou o curso de Medicina foi rapidamente nomeado para 2º Assistente de Patologia Geral e de Anatomia Patológica. Terminado o seu contrato de 6 anos continuou ainda mais dois na preparação da dissertação do seu Doutoramento perante a Faculdade de Medicina de Coimbra prestando provas a 19 e 20 de Julho de 1954. A dissertação intitulada Os mastócitos. Alguns aspectos da sua fisiopatologia foi discutida pelos professores doutores Ernesto Morais (FMUP) e Jorge Silva da Horta (FMUL).

Das doze teses apresentadas pelo candidato foram escolhidas duas O actual conceito de doenças difusas do colagénio não deve obscurecer o papel do SRH na sua génese e nas suas manifestações e A maior parte dos insucessos da esplenectomia das icterícias hemolíticas deve-se à existência de baços acessórios cuja argumentação coube aos professores Rocha Brito e Luís Raposo. Foi assim aprovado por unanimidade com 19 valores. Nesse mesmo mês tomou posse como 1º Assistente da FMCoimbra em 1954.

Trabalhou algum tempo, em 1952, no serviço de Anatomia Patológica da Universidade de Lisboa sob orientação do professor Jorge da Silva Horta procurando aprofundar os seus conhecimentos graças às condições de trabalho e espírito de orientação do professor. 

Durante mais de 6 meses foi professor na Escola Normal Social onde deu aulas de Patologia Geral e Biologia. Foi professor da Escola de Enfermagem da Rainha Santa Isabel desde a sua fundção e teve a seu cargo a regência das aulas de Patologia Geral e Patologia Médica do curso geral de Enfermagem.

Pertenceu a várias sociedade científicas: Ciências Médicas de Lisboa, Sociedade Portuguesa de Dermatologia e Venerealogia, Sociedade Anatómica Portuguesa, Association des Anatomistes e fez parte do quadro de colaboradores de O Médico e é redactor em Coimbra do Portugal Médico. Fez também parte do Conselho Médico-Legal de Coimbra.

Em 1949 viajou nas férias até Espanha, França e Itália durante visitando os serviços do Instituto de Histologia e Anatomia Patológica dirigido pelo professor Sanchez Lucas, em Barcelona, onde admirou uma boa colecção de peças anatómicas montadas em celoidina e uma colecção de embriomas do ovário. Na Cidade Universitária de Roma visitou o Hospital Policlínico, os serviços de Dermatologia do Prof Tomassi e por fim foi à cidade Universitária de Paris.

Foi autor de várias obras, teses, livros, artigos científicos e manuscritos.

Faleceu em Coimbra em 1996.

A fotografia mostra o Prof. Doutor Renato Trincão e sua Mulher, Dra. Vitória, ambos já falecidos, estando eu no meio. O Prof. Renato Trincão viveu, durante muitos anos, na Rua de Angola, 53-1º, morando eu no r/c. Como não tinham filhos, eu funcionava como o filho emprestado, digamos. Assim, quase todos os dias, depois de jantar, lá subia eu para conversar com o casal, que me tratava muito bem. Muitos dos Médicos do Bairro passaram-lhe “pelas mãos” através da cadeira de Anatomia Patológica, que era a sua paixão. Era um homem notável, com uma capacidade de trabalho invulgar e que muito me marcou (trabalhava 12 horas por dia!). Estive quase a ir para Medicina por influência dele. Era eu puto e já tinha visto toda a espécie de órgãos do corpo humano, pois ele levava-me à Faculdade, com alguma frequência. Adorava os seus alunos e tinha uma atenção muito especial pelos que iam a minha casa (o Rui Pato, o Reis Marques, etc, etc) que considerava terem uma grande virtude: serem uns grandes safados com as catraias (expressão nortenha!). Na realidade, tinha uma enorme curiosidade pelos envolvimentos amorosos da malta, gozando à grande quando eu e mais alguns ordinários enchiamos a minha casa de “francesame” (os meus Pais iam todos os fins de semana para o Porto!). Depois, queria saber todos os pormenores! Tinha muita piada com as perguntas que fazia! Mas o máximo, para ele, era emprestar-me a garagem para os bailes, dando-se ao trabalho de ir lá dar uma espreitadela! Enfim, um Professor Catedrático do nosso Bairro que, sendo brilhante, era uma pessoa normal e divertida!

Fonte
Texto e Foto in Cavalo Selvagem blog, Bino Reis, Coimbra

The photo shows Prof. Doctor Renato Trincão and his wife Dra. Vitória, both already deceased, with me in the middle. Prof. Renato Trincão lived, for many years, at Rua de Angola, 53-1º, me living on the ground floor. Since they had no children, I functioned as the borrowed child, say. So, almost every day, after dinner, I went up there to talk to the couple, who treated me very well. Many neighbourhood doctors passed him “by the hand” through the chair of Pathological Anatomy, which was the his passion. He was a remarkable man, with an unusual ability to work and that marked me a lot (he worked 12 hours a day!). I was almost going to medicine because of his influence. It was me pissed off and I had already seen all kinds of organs of the human body, as he took me to the Faculty, with some frequency. He loved his students and had a very special attention for those who came to my house (Rui Pato, Reis Marques, amongst other) whom he considered to have a great virtue: naughty with catraias (northern expression!). In fact, I was extremely curious about the loving involvement of the guys, enjoying it when I and some other ordinary people filled my house with “francesame” (my parents went all the time to Porto!). Then, I wanted to know all the details! I had a lot of fun with the questions I was asking! But the best thing for him was to lend me the garage for the dances, taking the trouble to go there and have a look! Finally, a Full Professor in our neighbourhood who, being brilliant, was a person normal and fun!
Source
Text and Photograph in blog Cavalo Selvagem, Bino Reis, Coimbra